
A Ética no Uso das Medicinas da Floresta: Respeito, Consagração e Propósito
agosto 5, 2025Entre os dias 25 e 30 de janeiro, um acontecimento sagrado e histórico reuniu 207 guardiões de sabedoria de 34 etnias, vindos não só das profundezas do Brasil, mas também de sete nações irmãs, Colômbia, Peru, México, Guatemala, Indonésia, Egito e Estados Unidos. O encontro? A 5ª Conferência Indígena da Ayahuasca, celebrada nas margens da Terra Indígena Rio Gregório, em Tarauacá, Acre, é um dos úteros espirituais da Mãe Floresta.
Ali, em meio à cantoria dos pássaros e ao sopro ancestral das árvores milenares, uma decisão tão potente quanto um trovão foi tomada: a criação de um Conselho de Liderança Espiritual dos Povos da Ayahuasca. Um chamado pela retomada do controle sobre a narrativa, o uso e a sacralidade da bebida sagrada, a Ayahuasca, que não é droga, nem produto, nem moda, mas sim espírito vivo, medicina viva, avó viva.
Um clamor contra o desrespeito espiritual
Das falas dos anciãos ecoou um grito silencioso, mas devastador: o conhecimento sagrado dos povos originários está sendo violado, distorcido e apropriado, não só por indústrias e igrejas, mas também por uma ciência muitas vezes arrogante, e por governos que legislam sem escutar.
Na carta endereçada aos nawa (não indígenas), os povos uniram suas vozes para afirmar, com dignidade, que apoiam o uso ético e responsável da ayahuasca, mas rejeitam com firmeza a sua mercantilização desenfreada e a criação de um mercado global desprovido de ética e reverência.
O manifesto diz com clareza:
“Rejeitamos todas as formas de comercialização da ayahuasca que criaram um mercado global além dos limites éticos.”
Ayahuasca não é um produto. É uma ponte.
A Ayahuasca, chamada de nixi pae, hoasca, daime ou yagé em diferentes linhagens, é uma bebida de poder espiritual, preparada há milênios pelas mãos de pajés, curandeiros, matriarcas e rezadores. Ela induz um estado ampliado de consciência, onde o tempo se desfaz, as memórias retornam com nitidez, os ensinamentos vêm em visões (as chamadas mirações) e a alma pode reencontrar seus fragmentos perdidos.
Ela não é recreativa.
Não é entretenimento.
Não é palco para egos deslumbrados.
É um espelho vivo da alma.
É um canal direto com o espírito da floresta.
É uma aliança ritual que exige respeito, preparo e integridade.
Globalização sem alma é colonização disfarçada
O alerta que ecoa da floresta é claro: a ayahuasca está em risco de ser desalmada. Quando tirada de seus contextos tradicionais e transformada em commodity espiritual para consumo ocidental, ela perde não apenas sua potência, mas também sua alma.
O Conselho de Liderança Espiritual surge, portanto, como um marco civilizatório, uma tentativa ancestral de interromper o ciclo da repetição colonial: a apropriação do que é sagrado sem permissão, sem escuta, sem reciprocidade.
O que podemos fazer como buscadores?
- Honrar a origem — Nunca beber ayahuasca sem saber quem preparou, qual a linhagem, qual o propósito e qual a ética do espaço.
- Recusar o turismo espiritual superficial — A medicina não é um atalho para iluminação. É uma escola que ensina com rigor.
- Apoiar os povos originários diretamente — Buscar formações, vivências, produtos e alianças que gerem benefício direto às comunidades indígenas.
- Escutar antes de ensinar — O saber ancestral não precisa ser traduzido. Precisa ser respeitado.
Que a Ayahuasca não seja mais um símbolo de colonização espiritual disfarçada de cura. Que seja um ponto de reconexão com o Sagrado. E que os povos da floresta voltem a ser reconhecidos como os verdadeiros detentores do verbo sagrado que cura, canta e sonha o mundo.
Namastê.
Autoria: Equipe de Comunicação do Templo Sagrado Namastê
Fonte de Inspiração: na matéria da Folha de São Paulo em Inglês.




